13/08/11

Já no Porto...














caros amigos que nos foram seguindo durante estes dois anos de guiné...

chegou a hora de voltar a soltar as amarras...

já estamos de novo no porto, numa das nossas "casas". já temos saudades da guiné e dos amigos que lá fizemos, mas a vida segue e leva-nos nestas aventuras.

desta vez, vai levar-nos até viana do castelo onde ficaremos a viver. será uma nova experiência! felizmente, quer eu quer o miguel ficaremos ligados a projectos de cooperação e desenvolvimento que, temos a certeza, ainda nos levarão por esse mundo fora.

obrigada por fazerem parte da nossa vida neste período tão especial. pela vossa companhia e apoio conseguimos, para além do trabalho oficial que realizamos nas nossas respectivas organizações, os seguintes feitos maravilhosos:
- a construção da escola de bidjope
- a compra de cerca de 80 packs de manuais escolares na campanha "Presentes Solidários"
- o apadrinhamento de 60 crianças da missão católica de canchungo

só com a ajuda de todos isto foi possível. agrademos a todos em nome dos que beneficiaram destas ajudas.
um agradecimento especial à manuela e à eunice, meus braços direitos em portugal, que impulsionaram todos estes projectos.

... despedimo-nos com um até breve... quem sabe nos encontraremos pelas ruas do nosso portugal... ou numas linhas escritas de algum canto desse mundo...

como dizia uma amiga, uma das grandes maravilhas desta vida é a descoberta de que o coração é elástico!...

06/08/11

Custa-me...


«Custa-me sempre partir… mas gosto de fazer as malas.

Fiz as malas mais uma vez. Já saí de casa. Já deixei Canchungo.

Nunca me é, e duvido que algum dia venha a ser, fácil deixar uma casa onde fui feliz.

Apesar de todas as vezes em que me queixei da falta de água, apesar de todas as dificuldades que a casa me fez passar, ficará sempre na lembrança como um cenário de partilha de Vida. Como cenário de experiência dura mas de crescimento, cenário de proximidade das pessoas.

De tempos a tempos, gosto de olhar para a minha vida e distinguir o importante do acessório. Descobrir o essencial.

E não apenas no sentido metafórico, gosto mesmo de poder decidir quais as coisas de que preciso para continuar a viver com paz, tranquilidade e segurança. Talvez por isso tenha sobrevivido sem grandes mazelas a viver em três países, cinco cidades, sete casas, em apenas quatro anos.

É de uma liberdade estonteante perceber que quase nada é essencial… as roupas, estas ou outras, um mínimo de produtos de higiene e medicamentos, algumas fotos, alguns livros, alguma música… sempre “estas ou outras”. Quando partimos é bom que a mala tenha espaço para permitir que o que vamos encontrar à chegada se instale nela.

O essencial está sempre connosco, se partimos inteiros. O essencial vai fazendo casa em nós. O essencial é a capacidade de fazer casa em qualquer lugar. O essencial é esse paradoxo de ir recheado com o que levamos de nosso e nos apresentarmos vazios para poder preencher com o que é novo.

Mais uma vez tive de reduzir a minha vida ao essencial, para vir a descobrir que Canchungo inteiro coube na minha mala. Essa que transporto para qualquer lado mundo. Essa que faz casa em qualquer lugar.

Gosto de fazer as malas… mas custa-me sempre partir.»

04/08/11

Notícias da Guiné - take final


Escrevo numa tarde de sesta, na casa das irmãs franciscanas de nossa senhora da aparecida, em canchungo. Apetece-me dormir, muito. Tenho levantado às 6.45 para dar formação nesta minha última semana na guiné, na qual, para além de ultimar o meu trabalho na fec, estou a dar uma ajuda aos professores da escola de canchungo, aquela onde também damos apoio com as 60 crianças apadrinhadas.

Esta minha vinda para canchungo teve vários objectivos, mas também foi muito uma escolha do coração, que queria despedir-se da guiné no local onde ele se apaixonou, mais uma vez, perdidamente, por um país africano.

Na semana anterior, estive em mansoa, a fazer uma maratona de gravação do meu programa de rádio, para deixar programas que possam ir para o ar até final de Setembro, mês em que chegará a próxima pessoa.

As minhas últimas duas semanas na guiné são em mansoa e canchungo.

Ainda bem que o mundo tem alguma ordem…

Olho para trás e vejo uma série de episódios que ainda gostaria de partilhar:

- o email surpreendente da maria grazia (a minha amiga de missão em moçambique, que ficou por lá até hoje) em que contava, com um ar animadíssimo, ter-me visto na RTP África, a dançar ao som dos Super Camarimba… as maravilhas da tecnologia! Dois países tão distantes unidos por uma televisão que passa, numa mesma língua, registos e coloridos bem diferentes! Portugal é muito mais rico por ter relações em todos estes continentes!

- as peripécias com o voto nas eleições legislativas e o seu formato estranhíssimo – recebemos uma carta do ministério dos negócios estrangeiros, com o boletim e todas as instruções. De tal formas complicadas que quase todos nos enganamos… :D depois de reabrirmos os envelopes (invioláveis!) com vapor de água, lá os tivemos de enviar por correio (!!). será que chegaram? É estranho não se ter a certeza se se votou ou não!

- o projecto no qual participei, em representação da fec, em parceria com o ministério da educação nacional e com a UNESCO, no qual estivemos a preparar o sistema de formação e certificação de professores a implementar no país. Assusta participar em algo tão grandioso e lidar com tudo isto juntando a militância com o institucional...

- o são joão que organizamos - o melhor de bissau, de certeza, mas também candidato a um dos melhores do mundo...

- as duas viagens que fiz com a ana pocinhas a bolama, ilha maravilha da natureza, que o homem conseguiu tornar ainda mais enigmática e misteriosa com a sua intervenção. momentos de beleza natural e de profundidade de uma amizade especial.

- os espectáculos do coro que foram um verdadeiro sucesso…

quem diria, emanuel, que umas canções de natal, nos corredores de casa, iriam terminar em dois grandes espectáculos em Bissau, numa “super-produção” com teatro, poesia e coro?! Foi uma grande lição de cultura e do que pode fazer o querer. Partilho em seguida alguns excertos do texto do nosso musical, para poderem conferir a sua qualidade, sensibilidade e profundidade (obrigada, carolina!).


«x - Uma onda leva sempre a outra onda, como uma terra leva sempre a outra terra e uma nova terra é sempre uma nova casa, num grande itinerário de moradas!…

y - Mas eu já tenho a minha casa, eu já tenho a minha terra…

x- Perceberás com o tempo que uma casa é um lugar que estamos sempre a conquistar…»


«Em qualquer aventura,

O que importa é partir, não é chegar.»


«x - Tenho medo!

y - Se não soubermos lidar com o medo, podemos naufragar nele, mas se nos deixarmos ir, também pode embalar-nos. No mar e no medo, nada pior do que não avançar…»


«Algumas palavras só o coração conhece: mãe, amor, saudade. Rafael não regressou, o verdadeiro fugitivo não regressa, não sabe regressar, reduz os continentes a distâncias mentais…

Escreveu num papel de carta, em rude caligrafia:

“A saudade mais sofrida é a que não se pode partilhar na nossa língua.”»


Já não tenho muito tempo para contar histórias… as últimas levo-as comigo!

Faz um ano que me despedia de canchungo, já com o coração triste pela partida.

Desta vez, quando deixar canchungo, amanhã, quase directamente para o aeroporto, não será só de canchungo que me despedirei… será da guiné, dos amigos da guiné, da minha vida na guiné… será mais outro capítulo da minha vida a virar a página…

E só me vêm à mente, e ao coração, as palavras que escrevi, neste mesmo local, no ano passado…